sábado, 18 de julho de 2009

Matei todos

Adriana acorda cedo todos os dias. Faz isso por disciplina. Antes de trabalhar tem que fazer seus exercícios físicos. É séria, compenetrada. Vai para academia com o carro novo que adquiriu com a ultima promoção no emprego. Volta lá pelas nove, toma uma vitamina e em poucos minutos está vestida para o trabalho. Vestida para trabalhar, ela sai de casa e vai abrir a porta do carro. Estou escondida atrás de uma árvore que ninguém vê, e atiro. Morreu achando que era só fazer as coisas direitinho que tudo daria certo.

Paulo dorme até tarde. A vida para ele não tem mais sentido. Não suporta a luz do sol, não quer ouvir o barulho da vida acontecendo lá fora. Se pudesse dormiria embaixo da cama. Paulo não tem mais coragem. Andou a linha até o final. Encontrou consigo mesmo e quebrou o espelho. Paulo levanta da cama escura e vai à geladeira tomar um gole de leite velho. Estou atrás da janela, com a mira pronta. Pum. Mato Paulo. Morreu depois das suas esperanças.

Roger é porra louca. Os amigos riem dele. Uns admiram sua falta de apego às coisas materiais. Outros invejam sua liberdade. Um dia está num negócio, no outro, uma novidade. Não segue regras, não tem horas, não tem relógio. Roger anda com um sapato de cada cor quando está com vontade. Não chega a causar choque. É o Roger! Namorou Paulinha e um dia disse que não gostava mais dela, ia para Belo Horizonte. Mas não foi. O dinheiro não deu. Ficou mais um pouco e foi ai que o peguei. Estava subindo na moto velha, à porta de casa, eu atrás de mais uma árvore. Pronto. Roger morreu sem régua e sem compasso.

Vivi era nova. Começando a vida profissional. Feliz em ter três empregos e mesmo assim não conseguir pagar as contas. Comprava roupa em brechó e curtia Mutantes. Saia com os primos e achava a vida linda. Tudo ainda estaria por acontecer. Escrevia e mails amorosos à mãe, que morava longe. Tinha uma saudade estranha do pai que não chegou a conhecer. Vivi era uma menina linda. Atirei nela no ponto de ônibus. Vivi morreu cheia de vida.

Matei todas essas pessoas. Não estou com medo que a polícia venha atrás de mim. A polícia procura pessoas reais. Desconfio eu que essas pessoas que matei não existiram. Elas eram parte de um sonho longo, desses que a gente sonha quando acha que tudo está perto do fim, mas de manhã tem pique e disciplina para correr atrás da vida. Esse sonho é coisa de menina que acredita que a vida é linda. Tem traços de porra louca que não se importa com a opinião alheia.
E saí matando todos eles. Assassina eu.