quinta-feira, 17 de abril de 2008

Viagem da alegria




Eu vesti a roupa da alegria e disse a todos(?) que demoraria Lavei umas louças, arrumei uns panos e fui. Parti para o perigo de roupa alegre. Cheia de cores, acendi um cigarro e previ que a viagem seria longa. Sentei no banco da frente, para ver tudo de mais perto. Precisava colocar o nariz nessa aventura, afinal não é todos os dias que saio vestida de alegria. Uma música tocava nos meus ouvidos. Uma não, várias. Era como se uma rádio interna fosse ser minha trilha sonora naquela viagem. O banco era confortável, deitei a cabeça para trás e olhei minhas meias a sapatos listrados. Talvez em algum ponto do caminho eu fosse confundida com uma palhaça, mas que importa? Estava vestida de alegria. Alegria não se importa com risadas alheias. Que riam, de alegria, de graça, de felicidade. Na primeira parada, fique indecisa: sorrir ou gargalhar quando um moço lindo me perguntou se podia sentar-se ao meu lado? Só-ri e disse que não, essa viagem, vestida de alegria eu deveria fazer sozinha. Que achasse outro banco, afinal alegria não é bondade. Ele foi. Continuei ao balanço das músicas internas. Uma viagem ao menos. Uma viagem de alegria. Não deu fome na próxima parada, quando um carrinho passou vendendo “de comer”. Mas deu sede. Pedi um pouco de cada bebida. Alegria é assim, divertida. Bebi um pouco de cada coisa e fiz uma pilha com os copinhos de plásticos. Eles não são politicamente corretos, mas eu os adoro. Eles significam a alegria do descompromisso. Tomar e jogar fora. Deu frio e eu coloquei o casaco da alegria, que estava na mala da alegria que estava aos meus pés. De casaco da alegria acho que chamei ainda mais a atenção. Olhavam para mim. Eu fiquei feliz, me levantei do meu banco e gritei a todos: vamos todos sorrir e conversar e ser alegres juntos nessa viagem. Vaia, foi o que ganhei. Foda-se. Estou vestida de alegria. Deitei a cabeça pra trás de novo e fiquei de olho na paisagem. As árvores me diziam que brotam todos os dias folhas novas em gargalhadas silenciosas. A terra me disse que pouco se dá com os pisos, todos os dias muda de cor em ímpetos felizes, o vento soprando pequenas piadas para que eu risse. Próxima parada, eu quero essa viagem rápida para ver se ela é mesmo verdade. Uma velhinha subiu e perguntou se podia sentar ao meu lado e mais uma vez, feliz, eu disse que não. Não tem espaço para mais ninguém aqui nesse banco minha senhora, só eu e a viagem da alegria, sinto muito. Tinha um livro na mochila da alegria, mas pra que palavras? Me digam, para que mais palavras? É preciso viver sem elas às vezes. É preciso estar solto, sem enredos. Os enredos fecham a vida em começo, meio e fim. Eu preciso apenas recomeçar, sem enredo. Roupa coloridas, música interna e muitas risadas, não sei se vocês me entendem. Minha alegria era tanta que peguei no sono. Assim, do nada. E te conto, é tão difícil para eu dormir. Mas peguei num sono bom, calmo. Agora não sei contar se o sonho foi sonho ou pesadelo. Eu sonhei que estava muito doente. Doente de tristeza. Sonhei que minha viagem era parada. Que minhas árvores estavam secas e meu solo rachado. Sonhei que o vento nem batia e que minha roupa era preta. Sonhei que estava sozinha sem querer estar sozinha. Não era opção. Acordei assustada. Indecisa. Cheguei a um ponto da vida em que é preciso decidir a viagem da alegria ou o sonho do real. Mas me deixei acordar devagar, como ando fazendo as coisas. O cobrador do trem veio falar comigo, numa língua que entendo pouco. Mas entendi que estava me cobrando. Eu deveria pagar. Ou descer. Olhei minha bolsa. Nada de dinheiro. Acabou antes da viagem começar. Sou sempre assim, despreparada, desorganizada. Disse que então desceria na próxima estação. Perguntei:

- Qual a próxima estação.

Ele respondeu em inglês:

- Joy Station.

Good enough, pensei em silêncio.



Foto: Signz_Droidz Deviantart

2 comentários:

Anônimo disse...

a liberdade implica a individualidade, mas, supõe uma dose de solidão... eu por exemplo amo o que cresce em LIBERDADE.

bjos

João Neto disse...

"...afinal não é todos os dias que saio vestida de alegria." (Camilla Tebet)

Não sei você, mas aproveito bem os dias em que saiu vestido de alegria. Não são muitos, nem são poucos, são tão comuns quantos os dias de tristeza ou de apatia, mas como são dias de alegria, então faço-os render ao máximo.